Em 2016, um verdadeiro escândalo tomou conta dos bastidores da Fox News:
Roger Ailes, o chege do canal foi demitido após inúmeras acusações de abuso
sexual contra funcionárias da empresa. As mulheres já estavam erguendo sua voz
contra o patriarcado e a supremacia branca que domina o mercado muito antes de
dois grandes movimentos (#MeToo e o TimesUp) se consolidarem no
mundo do entretenimento. E é essa história que acompanhamos em O Escândalo, que
chega aos cinemas brasileiros hoje.
Gretchen
Carlson (Kidman), Megyn Kelly (Theron) e Kayla
Pospisil (Robbie) são três funcionárias da Fox News em diferentes
momentos de suas carreiras. Enquanto Megyn é uma das âncoras mais respeitadas
do momento, Gretchen vai sendo afastada do posto de destaque e perdendo espaço
dentro da emissora. Enquanto isso, Kayla, uma jovem e promissora jornalista, se
deslumbra com as possibilidades que o canal pode te oferecer. Embora não se
unam diretamente para projetos na empresa, os caminhos dessas três mulheres se
cruzam por um único objetivo: desmascarar os assédios cometidos por Ailes.
Embora seja um pouco oponente, a direção de Jay Roach (Até o Fim) é
bastante eficiente na condução de suas temáticas, explorando com uma grande
profundidade os bastidores de sujo universo jornalístico. Dessa maneira, o
diretor opta em apresentar um primeiro ato bastante sarcástico, reservando ao
trio principal a tarefa de explicar, através de ótimas narrações repletas de
humor ácido, a podre burocracia. Nesse quesito, quem merece toda o destaque é
sua sequência inicial cômica e principalmente, por ser no período dos debates
pré “Era Trump”, um período que fizeram com que a comentarista ganhasse ainda
mais notoriedade por conta das diversas críticas contra o atual presidente
norte-americano. Roach ainda faz uso de eficientes montagens de caráter
mais documental, beneficiando-se da mescla entre dramatizações e arquivos de
vídeo tão bem administrada pela edição.
À medida que o filme vai avançando, podemos perceber uma redução
bastante necessária do humor, porém fica aquele gostinho que certos momentos poderiam
ser mais dramáticos se não fossem os alívios cômicos que acabam insistindo em
permanecerem. Outro ponto que acaba interferindo é que a edição de Jon Poll (do
ótimo O Rei do Show) em diversos momentos não consegue fazer a transição com
total fluidez entre suas protagonistas. Mas tudo isso é compensado por conta do
roteiro de Charles Randolph (A Grande Aposta), que mesmo soando bastante
familiar, consegue trazer muita coisa para ser pensada.
A assinatura de Randolph proporciona o público a grandes momentos
arrebatadores e com isso acerta em cheio. Cabe destacar o importante discurso
sobre a banalização da violência (tanto física quanto psicológica) que são
realizadas quase que diariamente contra as mulheres, mostrando como essa
impunidade daqueles cuja ações são normalizadas prejudicam movimentos femininos
como esse que ocorreu na Fox News. Juntando isso, o espectador irá encontrar
também um argumento bastante poderoso sobre o contagioso silêncio (que praticamente
é alimentado pelo medo e a sensação de impotência) que se reproduz nesses
ambientes tóxicos, e que através do fortalecimento dos laços do nosso trio
principal mostra que a união é o melhor remédio.
Sobre o elenco, é quase injusto ignorar que ele também não mereça o
destaque como o roteiro. O desempenho de Charlize Theron (que surge quase que irreconhecível
por conta do trabalho de maquiagem) e Margot Robbie, em especial. A primeira é
dona do maior tempo em tela e é a que consegue de uma maneira magistral transmitir
toda a ousadia e o cansaço perante as repetições da busca por grandes melhoras,
convencendo como uma mulher cujo poder, quase que no limite, precisa de um empurrão.
Enquanto a segunda, é quem mais impressiona, por carregar na personagem uma inocência
que contrasta com toda a ferocidade da primeira, porém é dela as cenas mais
angustiantes e repulsivas. Porém não podemos dizer o mesmo sobre a atuação de
Nicole Kidman, que acaba sendo sabotada pelo roteiro (sendo talvez essa única
falha de Randolph) e que não consegue aproveitar todo o potencial que sua
Gretchen Carlson possui. Mesmo sendo a primeira a se manifestar contra Ailes e
dona de uma inegável coragem, o seu desenvolvimento merecia muito mais tempo em
tela.
O Escândalo é um filme necessário para os dias de hoje, mesmo que por
vezes soe como familiar. Com atuações fabulosas de Charlize Theron e Margot
Robbie, é aquele filme que vai fazer você ficar pensando depois de sair da sala
de cinema por algumas horas.
Nota: 8.5/10
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